“Naquele lugar, a guerra tinha morto a estrada. Pelos caminhos só as hienas se arrastavam, focinhando entre cinzas e poeiras. A paisagem se mestiçara de tristezas nunca vistas, em cores que se pegavam à boca. Eram cores sujas, tão sujas, que tinham perdido toda a leveza, esquecidas da ousadia de levantar asas pelo azul. Aqui, o céu se tornara impossível. E os viventes se acostumaram ao chão, em resignada aprendizagem da morte.”
O escritor angolano Kalaf Epalanga recorda que “Terra sonâmbula”, do moçambicano Mia Couto, o marcou muito. No romance, o menino Muidinga e seu velho protetor Tuahir caminham a esmo, fugindo da morte. Quando foi lançado, em 1992, tanto Angola como Moçambique enfrentavam os efeitos de guerras civis devastadoras. “Lembro-me de que, quando este livro me chegou à mão, foi numa altura em que em Benguela, minha cidade-natal, estavam a chegar centenas e centenas de refugiados, pessoas que caminharam a pé, passando por um verdadeiro inferno para sobreviver.”