Praça dos heróis

Praça dos heróis

Thomas Bernhard

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NÃO HÁ SAÍDA: A VIENA INFERNAL DE THOMAS BERNHARD

Em agosto, estreamos aqui no Instagram a Temporada no Inferno, dedicada a livros que tratam, à sua maneira, de diversas situações infernais. Para a penúltima semana da temporada, selecionamos “Praça dos Heróis”, de Thomas Bernhard. Conhecido no Brasil sobretudo por seus romances e contos, Bernhard foi também autor de peças teatrais. Um dos maiores escritores contemporâneos de língua alemã, ele volta, em “Praça dos Heróis”, a dois temas constantes em sua obra: o suicídio e a Áustria.

“Praça dos Heróis” se passa em 1988, no dia do enterro de um professor judeu que voltara a Viena depois de muitos anos exilado com a família na Inglaterra. Os diálogos entre família, empregadas e uns poucos amigos reunidos após o funeral do professor Schuster contam a história dele e de sua esposa. Instalado em um apartamento defronte à praça onde, 50 anos antes, austríacos haviam celebrado sua anexação à Alemanha nazista, o casal padece nesse retorno ao país natal. Ela é assombrada pelo alarido de 1938, como se as multidões ainda estivessem saudando Hitler. Ele, não sendo capaz de se adaptar ao país em que via ainda sinais do nacional-socialismo, comete suicídio.

Encomendada para ser encenada na comemoração dos 100 anos do Burgtheater de Viena, em 1988, a peça provocou enorme polêmica ao sugerir que a Áustria permanecesse a mesma dos tempos do nazismo. “Considero essa peça uma ofensa grosseira ao povo austríaco”, teria dito o então presidente da República. “Minha peça é horrível, mas o teatro que se passa em torno dela é igualmente horrível”, respondeu Bernhard.

Um dos mais celebrados escritores contemporâneos europeus, o austríaco Thomas Bernhard (1931-1989) escreveu poemas, contos, novelas, romances e peças teatrais. É autor de, entre outros livros, “Perturbação” (1999), “O náufrago” (1996), “Extinção” (2000) e “Origem” (2006).


“Basta sair da porta para fora e o inferno se instala.”

“Quando eu finalmente estiver em Oxford
vou poder respirar disse o professor
as coisas aqui em Viena agora estão piores
que há cinquenta anos sra. Zittel
Cuspiram na minha filha sra. Zittel
Sentir medo todos os dias sra. Zittel
eu não aguento mais isso
estou velho e fraco demais para a Áustria
Existir em Viena é desumano
A começar pela doença mental da minha mulher
tenho de sair de Viena
Agora até de noite ela já ouve
a gritaria da Praça dos Heróis
Eu não deveria ter renunciado
à cidadania inglesa
isso foi um erro

[…]

Basta sair da porta para fora
e o inferno se instala
Na universidade sra. Zittel é preciso
passar por um corredor polonês de ódio
para ir comprar um pãozinho na esquina
a pessoa se encolhe toda disse o professor”

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Trecho de “Praça dos Heróis”, peça de Thomas Bernhard, em tradução de Christine Röhrig para a edição da Temporal.


MIKA LINS E MARIA MANOELLA LEEM “PRAÇA DOS HERÓIS”

“não consigo mais existir aqui
eu acordo e tenho de lidar com o medo a situação de hoje é igual
à de 1938
há hoje mais nazistas em Viena
que em 1938
você vai ver
isso vai acabar mal
nem precisa ser muito
inteligente para saber
eles vão voltar a sair
de todos os buracos”

Convidamos as atrizes Mika Lins e Maria Manoella para uma leitura dramática de “Praça dos Heróis”, peça de Thomas Bernhard. Na cena, elas interpretam Anna e Olga, duas irmãs conversando na volta do enterro de seu pai, o professor Schuster.

Escrita por Thomas Bernhard em 1988, por ocasião do centenário de abertura do Burgtheater de Viena – e, coincidentemente, cinquenta anos depois da anexação da Áustria pela Alemanha nazista –, a peça causou furor ao denunciar o nacionalismo e o antissemitismo na Áustria daqueles dias. Nela, incapaz de se readaptar ao seu país natal, de onde havia se exilado, um professor judeu se suicida diante dos sinais da persistência do nazismo. Após o funeral, família, amigos e empregados se reúnem e, em meio a discussões, tentam compreender a morte trágica.

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Mika Lins (@mikalinz) é atriz e diretora de teatro. Atuou em peças como “A casa de Bernarda Alba” (1984), “Frida” (1996), “Cacilda” (1998) e “Frankensteins” (2002), e dirigiu “Dueto para Um” (2010), “Festa no covil” (2013) e “Tutankáton” (2019), entre outras produções. Em setembro deste ano, dirigiu “Pós-F”, monólogo com Maria Ribeiro.

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Maria Manoella (@_maria_manoella) é atriz. Entre outras produções, atuou nas peças “A casa de Bernarda Alba” (2003), “Ricardo III” (2006), “O Natimorto” (2009) e “O Teste de Turing” (2016), nas séries “Mandrake” (2006) e “JK” (2006), e no filme “A vida invisível” (2019).


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